A diplomacia brasileira sempre se posicionou a favor da expansão do grupo, mas preferia que os novos países não tivessem o mesmo status dos membros fundadores

A 15ª Cúpula do Brics ficou marcada pela expansão do bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Foram convidados a participar, a partir de janeiro de 2024: Argentina, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã. O encontro, encerrado na última quinta-feira (24/8) na cidade sul-africana de Joanesburgo, também reforçou a estratégia de enfrentamento da hegemonia do dólar através da adoção de moedas locais nas transações comerciais com os países-membros.
A diplomacia brasileira sempre se posicionou a favor da expansão do grupo, mas preferia que os novos países não tivessem o mesmo status dos membros fundadores. O que, na prática, acaba diluindo o poder de influência de Brasília, especialmente com o fortalecimento crescente da China desde a fundação do Bric em 2006, ainda sem o “S” de África do Sul (South Africa), que entraria para o grupo em 2011.
Os chineses respondem por 70% do PIB dos Brics e conseguiram, por exemplo, pressionar a Índia – com quem mantém disputas territoriais – a aceitar a entrada da Arábia Saudita, país que tem uma das maiores reservas de petróleo do mundo e é o principal aliado dos Estados Unidos no Oriente Médio. Ao incluir também o maior adversário de Washington na região, o Irã, os Brics tentam enfraquecer a influência norte-americana numa área estratégica.
Ainda que os líderes do grupo tenham negado, a expansão dos Brics é vista como uma forma de contraposição ao poder do G7, grupo de países mais industrializados do mundo, formado por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido.
Se por um lado a expansão dilui o poder de influência do Brasil, por outro, a equipe diplomática liderada pelo presidente Lula conseguiu negociar a entrada da vizinha Argentina, nosso principal parceiro estratégico, além de convencer o líder chinês Xi Jinping a finalmente apoiar a expansão do Conselho de Segurança da ONU, uma demanda histórica da diplomacia brasileira, que foi incluída no texto final da “Declaração de Joanesburgo”.
Com a expansão, a população dos países do Brics somada passou de 41% a 46% do planeta, e pode aumentar nos próximos anos, já que dezenas de outras nações solicitaram entrada no bloco. Até mesmo a França pediu para participar da Cúpula de Joanesburgo, mas teve sua presença vetada pela Rússia, que não pôde ser representada por seu presidente. Vladimir Putin corria risco de ser preso já que África do Sul integra o Tribunal Penal Internacional (TPI), que emitiu mandado de prisão contra o líder Russo em razão da guerra da Ucrânia.
Para Lula, a expansão dos Brics é apenas uma entre diversas iniciativas em defesa da retomada do multilateralismo na política mundial, incluindo o fortalecimento de outras instâncias, como o G20, as Conferências do Clima e a Organização Mundial do Comércio (OMC), que nos últimos anos foi preterida em favor de acordos bilaterais.
Um sinal positivo nesse sentido, segundo Lula, é o fato da Europa e dos Estados Unidos terem passado a se referir aos países do Brics como “Sul Global”, e não mais como “3º mundo” ou “países em desenvolvimento”, dois termos com carga depreciativa, na sua opinião.
O presidente também aproveitou a viagem à África para estreitar relações com um continente com fortes vínculos históricos e culturais com o Brasil. Lula se reuniu com representantes do Congresso Nacional Africano, o partido de Nelson Mandela, que hoje governa a África do Sul, e foi a Luanda receber a Ordem Dr. Antônio Agostinho Neto das mãos do presidente de Angola João Manuel Lourenço.
Após a cerimônia de entrega da mais alta honraria oferecida a líderes estrangeiros pela ex-colônia portuguesa, Lula deu entrevista coletiva, onde propôs que as dívidas dos países africanos com o Fundo Monetário Internacional (FMI), estimadas em US$ 800 bilhões, fosse “transformada em apoio a infraestrutura”. O presidente também voltou a defender a ampliação do Conselho de Segurança da ONU, com a entrada de Brasil, Japão, Índia e Alemanha.
Ainda que a viabilidade das duas propostas seja questionável, é inegável que, em menos de nove meses, o governo Lula conseguiu recuperar o protagonismo do Brasil no cenário mundial após quatro anos de isolamento promovido pelo governo Bolsonaro. Em outubro de 2020, o então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, chegou a dizer “que sejamos esse pária”, após ser questionado sobre o desprezo da comunidade internacional vinha demonstrando em relação ao nosso país.
Leo Puglia
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